Ensaio clínico mostra benefícios da administração de células do cordão umbilical a doentes com COVID-19
Apesar dos enormes esforços de investigação realizados ao longo de 2020, as opções de tratamento para os doentes com COVID-19 continuam, ainda, a ser muito limitadas. Embora haja uma grande percentagem de doentes a reportar apenas sintomas ligeiros, outros apresentam uma forma grave da doença, que se pensa estar associada a uma hiperativação do sistema imunitário, em resposta à infeção viral. Frequentemente, estes doentes desenvolvem síndrome da dificuldade respiratória aguda, também designada por ARDS (do inglês, Acute Respiratory Distress Syndrome), com agravamento do prognóstico. Tendo em conta que a taxa de mortalidade de doentes com COVID-19 que desenvolvem ARDS é de cerca de 52%, é urgente encontrar soluções capazes de controlar a resposta imunitária e promover a recuperação destes doentes.
Um dos tratamentos que têm vindo a ser investigados para este efeito é a administração de células estaminais mesenquimais do cordão umbilical. O enorme potencial terapêutico destas células, decorrente da sua ação anti-inflamatória, imunomoduladora e regenerativa, foi já demonstrado numa vasta gama de estudos. Na sequência dos resultados promissores que têm sido obtidos numa série de doenças, nomeadamente doenças autoimunes, como lúpus eritematoso sistémico, diabetes tipo 1 e artrite reumatoide, estas células estão agora a ser investigadas no tratamento de ARDS decorrente de COVID-19.
Células estaminais melhoram sobrevivência e tempo de recuperação de doentes com COVID-19
Um novo estudo, recentemente publicado na revista Stem Cells Translational Medicine, concluiu que a administração de células estaminais do tecido do cordão umbilical é segura e potencialmente eficaz no tratamento de doentes com COVID-19 em estado grave. Este ensaio clínico, realizado nos EUA entre abril e julho de 2020, incluiu 24 doentes com COVID-19 hospitalizados, com ARDS moderada a severa, dos quais 46% a receber oxigénio através de ventilação mecânica. Os 12 doentes alocados ao grupo de tratamento receberam duas infusões de células estaminais mesenquimais do cordão umbilical, com três dias de intervalo. Em vez de células estaminais, os doentes do grupo controlo receberam duas infusões de placebo. Adicionalmente, todos os doentes foram tratados de acordo com as guidelines em vigor para o tratamento de COVID-19 e seguidos durante um mês após a primeira infusão.
Trinta e um dias após o início do tratamento experimental, verificou-se que a sobrevivência no grupo que recebeu células estaminais do cordão umbilical foi de 91%, significativamente melhor que a de 42% registada no grupo controlo. Para além disso, o tempo de recuperação dos doentes que receberam células estaminais foi significativamente menor, o que também sugere que o tratamento foi eficaz. As análises ao sangue efetuadas revelaram que, 6 dias após o início do tratamento experimental, o grupo de doentes que recebeu células estaminais apresentava uma melhoria nos níveis de vários fatores inflamatórios, tipicamente aumentados nestes doentes, tendência que não foi observada no grupo controlo. Quanto à segurança, não se observaram diferenças entre os grupos relativamente à incidência de efeitos adversos, o que indica que a administração de células estaminais do cordão umbilical é segura. No seu conjunto, estes resultados sugerem que a administração de células estaminais é segura e tem um efeito positivo na evolução de doentes com ARDS decorrente de COVID-19, promovendo uma recuperação mais rápida e melhorando a sua sobrevivência.
Embora preliminares, estes resultados justificam esforços adicionais no sentido de explorar o potencial das células estaminais do tecido do cordão umbilical no tratamento de COVID-19, nomeadamente em sinergia com outras estratégias que têm vindo a obter resultados favoráveis, como o uso de dexametasona e plasma convalescente. Estudos aleatorizados com maior número de doentes são necessários para estabelecer a eficácia deste tratamento inovador.
Referência:
Can A, et al. Umbilical cord mesenchymal stromal cell transplantations: A systemic analysis of clinical trials. Cytotherapy. 2017. (12):1351-1382.
Lanzoni G, et al. Umbilical cord mesenchymal stem cells for COVID-19 acute respiratory distress syndrome: A double-blind, phase 1/2a, randomized controlled trial. Stem Cells Transl Med. 2021 Jan 5. doi: 10.1002/sctm.20-0472 [Epub ahead of print].